quarta-feira, 24 de julho de 2013

Secretaria alerta para risco de redução de direitos no Estatuto da Pessoa com Deficiência



Tramita no Congresso Nacional a proposta de criação de um Estatuto da Pessoa com Deficiência, que pode alterar – para o bem e para o mal – o conjunto de leis que garantem os direitos das pessoas com deficiência no Brasil.

A Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo produziu a seguinte avaliação sobre o documento, encaminhada aos relatores da proposta:

ANÁLISE DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
Após análise do Estatuto da Pessoa com Deficiência, a equipe técnica da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo  posiciona-se contrariamente à aprovação do texto, pelas razões expostas a seguir:

A princípio, nos parece que o próprio formato de Estatuto não se justifica, uma vez que o documento traz pouquíssimas novidades e mais retira direitos do que aperfeiçoa a legislação já existente.

Muito mais apropriado seria propor alterações pontuais em determinadas leis, com o devido debate parlamentar e junto a sociedade civil, procedendo-se, posteriormente, a compilação das leis – alteradas ou não – que garantam os direitos das pessoas com deficiência, de modo a facilitar sua consulta, atividade inclusive dificultada pelo modelo do Estatuto, em geral confuso e fazendo referência a leis sem, no entanto, apresentá-las na íntegra, dificultando a compreensão das reais mudanças propostas.

A consolidação de leis é o recurso mais utilizado pelos parlamentos modernos, evitando equívocos e distorções.

Cabe ressaltar que a tramitação de um documento extenso e único como este no Congresso abre a possibilidade de que receba emendas que o descaracterizem ainda mais, trazendo o risco de ser aprovado um texto que não reflita os anseios das pessoas com deficiência.
Independentemente dos fatores apresentados acima – modelo confuso e formato inapropriado para uma tramitação segura – o texto analisado carrega ainda erros conceituais e proposições não condizentes com a construção histórica da inclusão com autonomia, liderada pelo movimento social das pessoas com deficiência.

Entre os pontos mais incongruentes presentes no documento, podemos destacar:
O artigo 7 afirma que “Todas as pessoas com deficiência são iguais perante a lei e não sofrerão nenhuma espécie de discriminação”, ou seja, de forma desnecessária e incoerente, garante a equiparação de oportunidades exclusivamente entre as pessoas com deficiência e não com toda a população.

Os artigos 52 e 120, por exemplo, reintroduzem uma ideia já amplamente rechaçada pela sociedade quando dos debates em torno do PL 112, recentemente retirado da pauta do Congresso: a permissão para que empresas substituam a contratação de trabalhadores com deficiência pela simples oferta de cursos de capacitação, o que a sociedade civil organizada já deixou claro ser inaceitável. Na prática, os artigos legalizam a substituição do cumprimento da Lei de Cotas por medidas compensatórias e ainda abrem importante brecha para que empresas aleguem atuar em segmentos com grande número de postos de trabalho insalubres ou perigosos, ficando dispensadas de cumprir a cota.

Da mesma forma, o capítulo sobre o Direito a Assistência Social deixa de introduzir questões já amplamente discutidas, como a necessidade de considerar os custos adicionais da deficiência na redefinição de valores e critérios de elegibilidade dos benefícios sociais.
O artigo 64, que trata das vagas reservadas em estacionamentos, tem uma redação que implica em redução de direitos, pois não menciona as vagas nas vias públicas e também não explicita que, nos estacionamentos privados, deverá ser garantido o número mínimo de uma vaga.

O texto traz ainda retrocessos em áreas como a educação e deixa de avançar no campo da reabilitação, ignorando demandas históricas, como a fisioterapia de manutenção.
Estes são apenas alguns dos sérios problemas presentes no documento e que parecem transparecer que os responsáveis por sua construção – seja por desconhecimento ou por indução – ficaram demasiadamente expostos a pressões de interesses econômicos ou de apenas alguns segmentos da sociedade civil, deixando de ouvir os principais interessados: as pessoas com deficiência.

Assim, embora o documento traga alguns aspectos positivos – como a retirada dos aprendizes para cumprimento da Lei de Cotas e a transformação da curatela total da pessoa com deficiência intelectual em medida extraordinária – tais avanços não compensam o enorme prejuízo que a aprovação deste Estatuto traria para a sociedade brasileira.

A equipe técnica da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo recomenda aos relatores que o referido documento seja arquivado ou passe por profundo debate junto a sociedade, por meio de audiências públicas, retomando, posteriormente, a tramitação nas devidas Comissões do Congresso Nacional.


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