quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Perguntas sobre a eleição

Foi lançada a candidatura oficial do PT, partido que depende do sr. Luiz Inácio da Silva. Embora só uma parte da agremiação aceite Dilma, a ministra foi, afinal, a escolhida. Se a militância assume ardorosamente, ou não, a sua campanha, entramos em outro assunto. A batalha não se restringe aos “companheiros”, mas supõe os oligarcas do PMDB e de aristocracias menores. Entre os que apoiam o governo no Congresso, Dilma não é unanimidade a favor. Adestrada no centralismo autoritário, ela tem dificuldades para fazer alianças, firmar parcerias etc. Seu costume é mandar de maneira vertical, não aceitar réplicas. Políticos que apoiam o presidente têm ressentimentos e dúvidas sobre ela na presidência. Seu apoio não será entusiasta. A candidata oficial à presidência não consegue os meios (por enquanto) de garantir adesão unânime da “base aliada do governo”.

O seu perfil é comum a muitos militantes do autoritarismo: vontade imposta sem discussões a quem, na base partidária, ou nos escalões inferiores, supostamente só deve obedecer mecanicamente com um “sim, sim, sim senhora”. Além da crença enraizada nas virtudes do Estado (sobretudo no Executivo), ela é alheia à atividade parlamentar e se torna politicamente vulnerável devido à sua estrita confiança em procedimentos tecnocráticos. As palavras “diálogo”, “persuasão”, “acordos” não entram na prática do PT e, muito menos, na de Rousseff. Mas é preciso repetir que o Estado brasileiro ainda é dirigido por oligarcas poderosos, não acostumados a obedecer, mas a mandar. Para adquirir o apoio de tais oligarcas, seria necessário que a ministra tivesse capacidade de persuasão, perspicácia nos acordos (marcas indiscutíveis de Luiz Inácio da Silva). Quanto à saúde, o dado é irrelevante, a sua doença está controlada e ela mostra vontade férrea de chegar ao cargo máximo da República. Como diz Canetti em Massa e Poder, o costume de mandar faz o poderoso sobrevivente...

Qual a ideologia da petista que se lança na corrida presidencial? Luiz Inácio da Silva jamais pertenceu a organismos esquerdistas, nunca se pautou pelos dogmas revolucionários. Qualquer ministro que não seja da direita (existem tais pessoas, como o sr. Lobão) está à sua esquerda. Rousseff é adepta da direção econômica pelo Estado e defende o controle do mercado pelo setor público. Mas é pragmática. Se eleita, ela não assumirá políticas como as de Chávez, mas tudo fará para ampliar o controle do Estado sobre a economia, a mídia, as universidades. Dilma seguirá o atual presidente na política externa. Se ela ganhar a eleição, será acirrada a animosidade contra os EUA. Mas sem ruptura. O alvo é conquistar a cadeira no Conselho de Segurança da ONU. O papel de “mediador” — que o Brasil oferece ao Irã e às piores ditaduras africanas — permite aspirar a referida cadeira. Na América, relações calorosas com a Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador. E as pesquisas? Dilma tem contra sua aspiração vários pontos. Só com as viagens, sob as asas do presidente, seu nome deixou o anonimato. Serra é conhecido porque presidiu a UNE, apoiou João Goulart, foi exilado no Chile, regressou ao País e desenvolveu atividades no Legislativo. Ele foi ministro de FHC, quebrou a patente de remédios contra a Aids, etc. E governa um Estado poderoso.

E na oposição ? Nem tudo é promessa de bom sucesso no campo que postula chegar ao poder. O PSDB está dividido e não tem diretórios em todos municípios do País (o mesmo ocorre com o PT, daí ser vital a aliança com o PMDB). Os tucanos ainda não têm estratégia eleitoral coerente, talvez não haverá tempo para construí-la. As rusgas entre Serra e Aécio demonstram fraturas no partido. E tais conflitos podem ser fatais. Uma “cristianização” do candidato tucano não está fora da pauta. Daí, a cautela de Serra em anunciar sua entrada oficial na corrida rumo ao Planalto. O aliado DEM está imerso no caso de Brasília. Rousseff reúne especialistas refinados de marketing como João Santana. Caso Serra não assuma com decisão a candidatura e seu partido não se una, a diferença tende a diminuir.

Roberto Romano é professor de Ética e Filosofia na Unicamp

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